Quando tinha 7 anos, Ysabella Santos Cavalcante gravou um vídeo para o TikTok, escondido dos pais e, durante o registro, caiu e bateu as costas no chão. Para evitar uma bronca, não comentou nada com o pai, Gustavo Maia Cavalcante, 40, e com a mãe, Estefane Kerolen Domiciano Santos, 36, com os quais reside no Guarujá, litoral paulista, além do irmão, de 16 anos.
O acidente não pôde ser ocultado por muito tempo. Durante quatro dias após a queda, a menina teve febre, vomitou e, porque os sintomas não avam, foi levada para uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA), em 9 de novembro de 2022.

Quando tinha 7 anos, Ysabella Santos Cavalcante gravou um vídeo para o TikTok, escondido dos pais e, durante o registro, caiu e bateu as costas no chão / Reprodução
A vida dela e da família mudou desde então. No hospital, um grande tumor foi identificado na região torácica da criança, atualmente com 9 anos, que segue tratando o Neuroblastoma grau 4 (considerado de estágio avançado).
Tratamento pesado
Da UPA, Ysabella foi transferida para o Hospital Guilherme Álvaro, em Santos, de onde foi encaminhada para o Instituto de Tratamento do Câncer Infantil (Itaci), na capital paulista, em 18 de novembro daquele ano.
“Já no Itaci, fizeram o diagnóstico completo. O câncer tinha se originado no tórax, mas já tinha se alastrado para os ossos e medula”, explicou o pai ao Metrópoles. As sessões de quimioterapia de Ysabella começaram em 8 de dezembro de 2022 e, desde então, os pais se desdobraram para levar a criança do Guarujá para São Paulo.
Até o momento, a garota já foi submetida a quimioterapia, radioterapia, a uma cirurgia para a retirada do tumor primário (no tórax), além de um transplante de medula. Antes do câncer, ela já fazia acompanhamento médico, porque nasceu com somente um rim.
Desemprego e dívidas
“Como faltei algumas vezes do trabalho [para levar a filha ao hospital], mesmo com atestado, fui demitido e minha esposa também acabou ficando sem emprego. Então, faço bicos e, também, fazemos campanhas pedindo ajuda na internet, apesar de algumas pessoas nos criticarem por isso.”

Até o momento, a garota já foi submetida a quimioterapia, radioterapia, a uma cirurgia para a retirada do tumor primário (no tórax), além de um transplante de medula / Reprodução
Gustavo trabalhava em uma marmoraria durante o dia, além de atuar como músico no período noturno. O tratamento intensivo de Ysabella impediu a frequência dos serviços, gerando dívidas, como o atraso no pagamento até de contas básicas, como a luz. A esposa mantinha um comércio on-line, que foi encerrado em decorrência da atenção demandada pelo tratamento da filha.
Por mês, incluindo as viagens de ida e volta para São Paulo, assim como o custeio da alimentação e higiene da menina, a família gasta por volta de R$ 12 mil. Além dos bicos e doações, Gustavo acrescentou contar com a ajuda da mãe, em algumas ocasiões.
Sem energia elétrica
No retorno da mais recente viagem à capital paulista, por volta das 18h30 de quinta-feira (23/5), a família constatou que a casa, no bairro Vila Zilda, no Guarujá, estava sem eletricidade. A distribuição de luz foi cortada e o relógio medidor lacrado, como mostra uma postagem de Gustavo em uma rede social.
“Quando a gente pede ajuda e as pessoas desconfiam, pensam que é mentira, tá aqui ó. Pra Ysa não ficar sem o tratamento, a gente deixa de pagar algumas coisas”, compartilhou Gustavo, mostrando o relógio de luz lacrado.
Ele explicou à reportagem que, para evitar os cortes, pagava sempre uma conta, deixando outras atrasadas. Essa dinâmica, porém, teria mudado, segundo explicado por um atendente da Neoenergia Elektro ao pai de Ysabella. A empresa, acrescentou Gustavo, está ciente da doença da menina e, por isso, cobra menos pelo consumo de eletricidade na casa.
Isso não impediu o corte, para o desespero dos pais — porque, no congelador, havia R$ 50 mil em medicamentos, para ajudar na imunidade de criança, debilitada por conta do tratamento agressivo ao qual é submetida.
Os medicamentos não foram perdidos, conforme relatado por Gustavo, nessa sexta-feira (23/5). Os alimentos comprados exclusivamente para a dieta da garota, porém, precisaram ser jogados fora, acrescentou.
Apesar das dificuldades, a família segue se esforçando para garantir o tratamento que, segundo o Gustavo, não tem prazo para ser concluído.
Emocionado, ele afirmou que a filha vende pulseirinhas para “ajudar no pagamento das contas”. “Quem nos dá força e incentiva a não desanimar é a Ysa. Ela sempre foi uma criança animada, com uma ótima energia, e não perdeu isso mesmo com a doença. Ela também dá força para outras crianças em tratamento, falando para elas não perderem a fé”, disse, com a voz embargada.
O que diz a Neoenergia
A Neoenergia afirmou, em nota encaminhada à reportagem, que a família de Ysabella não estava cadastrada como “atendimento preferencial”.
A empresa acrescentou que desconhecia sobre a situação da criança, afirmando estar à disposição da família para “qualquer esclarecimento sobre o cadastro”.
Os pagamentos atrasados, disse ainda, foram quitados nessa sexta-feira (23/5), quando a energia foi restabelecida no imóvel, no período da tarde.