23 de maio de 2025

Autora cearense que lança livro infantil no Acre nesta sexta fala sobre como escrever para as crianças atuais

“É um desafio porque hoje a criança tem na palma da mão todo tipo de distração que ela quiser, para o bem e para o mal”, diz

Autora cearense Manoela Queiroz Bacelar, que lança em Rio Branco (AC), nesta sexta-feira (16), no auditório do Teatro Hélio Melo, o livro infantil “12 coisas que a criança sabe que existem”, falou ao Contilnet sobre a obra.

É o segundo livro infantil de Manoela Queiroz, que tem um terceiro, sobre sua tese de mestrado em Direito, de conteúdo técnico e profissional, mas é com os infantis que a autora faz encontrarem-se a leveza da infância com temas como pluralidade, cidadania e imaginação.

Autora cearense que lança livro infantil no Acre nesta sexta fala sobre como escrever para as crianças atuais. Foto: ContilNet

Ela conta que o livro a ser lançado hoje ao público acreano é fruto de sua pós-graduação em Escrita Criativa da Unifor (Universidade de Fortaleza) e paralelo a seu texto em emocionante viagem ao universo infantil, traz a forma visual nas mãos do artista Fernando França, que assina as ilustrações lúdicas e cheias de simbolismos.

Obra é também um convite aos leitores de todas as idades a escutar com mais atenção o mundo como as crianças. Foto: ContilNet

Fernando França é acreano, com mais de 40 anos radicado em Fortaleza e um artista plural e internacional (veja entrevista com ele nesta página).

Enfim, a obra é também um convite aos leitores de todas as idades a escutar com mais atenção o mundo como as crianças o veem — e, talvez, reaprender com elas.

A seguir, os principais trechos de uma entrevista com a autora:

Manoela, como é escrever para crianças no mundo de hoje, em que, ao que parece, elas já nascem sabendo de tudo?

Manoela Queiroz – É um desafio porque hoje a criança tem na palma da mão todo tipo de distração que ela quiser, para o bem e para o mal – TikTok, Instagram, videogame, jogo… tudo elas tem na palma da mão, numa tela digital. Então, escrever para a criança exige que a gente tente, de alguma maneira, entrar nesse mundo infantil, nesse mundo fantástico. A tentativa, nesse livro, é essa, é criar frases e imagens de situações absolutamente fantásticas que remetem a esse mundo onde a imaginação é ilimitada, que é esse mundo infantil onde tudo é possível dentro da cabeça da criança, e o livro ilustrado traz também essa possibilidade.

Você acha que é possível concorrer com essa tecnologia?

Manoela Queiroz – Eu acho que é difícil. Hoje há os nichos também, mas eu penso que toda tentativa nessa direção é vantajosa. Toda tentativa nessa direção pode ter um proveito nem que seja para uma criança. Se você consegue atingir uma criança, essa uma criança pode fazer uma diferença.

Você tem filhos?

Manoela Queiroz – Tenho duas. Duas adolescentes. Uma tem 18, outra tem 15 anos. A mais velha, a de 18, é uma leitora contumaz, a Maria, e a Sara é muito envolvida com o desenho, com as artes visuais, ela pinta. Então, de uma certa maneira, as duas usufruem da tecnologia porque é o espírito do tempo, mas elas também gostam desse mundo da literatura.

Gostaria que você comentasse como é. por exemplo, e comigo não foi diferente que, como muitas outras pessoas, cresceu vendo os desenhos dos Picas-pau da vida e outras coisas do gênero, que avam e ainda am muita violência. Aliás, muitos desenhos atuais são muitos violentos e destinados às crianças. Como lidar com isso?

Manoela Queiroz – Existe todo um movimento atualmente para que o tempo de tela na mão da criança seja o mínimo possível.

Qual é o tempo ideal?

Manoela Queiroz – A sociedade de pediatria americana, eu não saberia dizer tecnicamente isso, mas eu já ouvi dizer que seria duas horas por dia. Tela, de uma forma geral, a depender da idade da criança. Lógico, para crianças menores seria isso. Mas existe um movimento nas escolas e também com os pais. Em alguns países, a Dinamarca, por exemplo, é um país que tem ido no sentido contrário da digitalização de livros. A Dinamarca tem se voltado para o livro de papel, os livros físicos. E existe um movimento no Brasil que quer diminuir o tempo de tela também para adolescentes e crianças. Em fazendo isso, diminui também o contato da criança com esse tipo de violência que você se refere, dos desenhos animados que têm hoje em dia um grau de violência mais explícito, digamos assim. Então, o livro ilustrado, quando ele é assim dirigido, ele prende à atenção da criança. No meu primeiro livro infantil, o “Vovó Zefinha e Eu”, que é um livro que relata memórias da minha infância, também é um livro ilustrado, mostro isso.

Falando agora de ilustrações: como você conheceu o acreano Fernando França?

Manoela Queiroz – O Fernando tem uma carreira muito sólida lá no Ceará, em Fortaleza. Ele é um artista muito apreciado e eu não sabia dizer como foi, mas conheço o Fernando já há muito tempo, e aprecio o trabalho dele, gosto da temática que ele explora. Para mim, é um artista que domina várias técnicas, aquarela, óleo sobre tela, é um grande colorista, um desenhista de mão cheia, e o Fernando tem também uma intercessão com a literatura. Ele é formado em letras, de modo que, quando me ocorreu de eu convidá-lo para ilustrar esse livro, eu fiquei muito feliz quando ele aceitou.

É o primeiro lançamento aqui ou você já lançou antes?

Manoela Queiroz – Nós lançamos em Fortaleza, na Bienal Internacional do Livro, há mais ou menos uns dois meses, e aí lançamos também numa galeria de arte em Fortaleza, que se chama Artesano, de uma arquiteta chamada Roberta. Ela nos convidou para lançar lá, e essa é a primeira vez no Acre, através do Fernando, que é muito conhecido e muito queiro aqui. Foi ele que promoveu esse lançamento aqui.

Pelo que você já lançou, pelo que você sentiu, como é que está sendo a recepção

Manoela Queiroz – Então, a receptividade desse livro está sendo muito impressionante. A gente fez umas dinâmicas com crianças em Fortaleza, e as crianças parecem muito encantadas com o que o livro pode oferecer. E o engraçado é que os adultos também, os pais têm gostado também, porque resgata a criança que existe dentro de cada adulto.

Com quantos anos uma criança deve começar a ler?

Manoela Queiroz – A nossa editora nos fala que esse livro seria para criança de 3 a 7, mas me parece que é um livro que extrapola isso. O livro ilustrado, ele é assim, ele extrapola essa faixa da idade. É um livro para a infância, mas também é um livro para o adulto. É um livro para qualquer idade, porque a imagem captura o inconsciente da gente, não é? A imagem entra na cabeça da gente de uma forma muito contundente. Então é um livro que eu acho que serve para crianças de qualquer idade, não é?

Como autora, como é que você vê o futuro do livro, o futuro da literatura, na cabeça da nossa juventude de agora e da juventude que está surgindo?

Manoela Queiroz – Sempre, quando uma tecnologia nova aparece, a gente pensa que a outra vai deixar de existir. Quando criaram a televisão, achavam que o rádio ia terminar, o rádio não terminou. Quando criaram o streaming, achavam que ia acabar o cinema, o cinema não terminou. Eu acho que o livro escrito, fiz, e quando começaram com o livro digital, acharam que o livro físico acabaria…

O Bill Gates escreveu um livro, o “Um Estrada para o Futuro”, dizendo que o livro físico iria acabar…

Manoela Queiroz – Ouso dizer que ele está enganado. O livro de papel, eu acho, não termina, não porque é uma grande tecnologia da humanidade. A escrita e o livro de papel, o livro físico, em que a gente tem o gesto de poder ar a página a página, em que a gente pode cheirar cada página, que a gente pode ir e voltar na hora que a gente quiser, para marcar e escrever … isso tudo, eu penso que não vai terminar, não. Eu acho que vai ser ao contrário. Agora mesmo a China tem uma biblioteca física que é a maior biblioteca do mundo. É nova essa biblioteca. Eles construíram um prédio gigantesco, moderníssimo, lindo, do ponto de vista arquitetônico. Para guardar livro físico. Então, eu acredito que o livro físico ainda tem aí uma longa jornada para ele.

O Brasil está preocupado com isso?

Manoela Queiroz – Sempre existem os bolsões de resistência em favor da literatura. E foi uma grande surpresa ver a quantidade de gente que tinha nessa Bienal Internacional do Livro, lá do Ceará. Embora tenha um movimento de fechamento das grandes livrarias, existe também um contra-movimento da abertura de pequenas livrarias, espaços onde possa haver uma convivência comunitária, um espaço onde a pessoa pode sentar e pegar um livro e abrir, pegar um outro e abrir. Então eu penso que o futuro pode ser promissor, apesar de tudo.

A literatura infantil alcança as crianças autistas que estão nascendo aos milhares? Já há alguém pensando nisso?

Manoela Queiroz – Já existem autores e autoras que incluem no seu elenco de personagens dentro da literatura, personagens com algum grau de autismo. Eu acredito que isso está crescendo e vai crescer ainda mais.

E os Mauricio de Souza, Walt Disney – eles ainda têm chance de sobreviverem com os seus personagens?

Manoela Queiroz – Eu acho que sim. Acho que sempre há espaço para o que é feito com qualidade artística, com cuidado artístico, com sensibilidade e com a vontade de tocar o outro, com a arte. Toda a vida em que há vontade de existir, há arte e, como já disse, se tocar uma criança, a missão está cumprida.

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